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A Jéssica é sim uma empreendedora com Síndrome de Down. Quer provas? Ta aí!

Ontem, de madrugada, recebi essa mensagem abaixo contestando o fato de dizermos que a Jéssica é uma empreendedora com Síndrome de Down. Achei que era um questionamento válido e uma boa oportunidade de esclarecer isso para todos.

Como eu mesmo já disse várias vezes, não dá para acreditar em tudo que a mídia divulga. Longe de mim criticar meus colegas de trabalho, mas existem profissionais e “profissionais”. E existe também a pressão por busca de cliques, que acaba levando alguns jornalistas “florearem” uma matéria visando somente o aumento de audiência.

Então, a moça que me mandou a mensagem está certa em contestar a veracidade dos fatos. E como nós do Bellatucci prezamos pela transparência e eu, Priscila Della Bella, jornalista, prezo pela verdade e pelas reportagens e matérias bem apuradas, resolvi escrever esse post para deixar bem claro a todos esse assunto.

O Sebrae, referência no assunto, define empreendedor como: “Numa visão mais simplista, podemos entender como empreendedor aquele que inicia algo novo, que vê o que ninguém vê, enfim, aquele que realiza antes, aquele que sai da área do sonho, do desejo, e parte para a ação”.

Só com isso, a Jéssica poderia sim ser definida como empreendedora. Ela sonhou em ter um restaurante, ela apresentou essa ideia para nós, que a lapidamos, para que ela se tornasse possível. Em um país cheio de preconceitos e falta de oportunidades para as minorias, em meio a crise econômica, ela iniciou algo novo. Ela plantou a ideia e, com nossa ajuda, saiu da área do sonho, do desejo e partiu para ação.

Mas não é só isso. A Jéssica é sócia legal da empresa, com contrato firmado e reconhecido em cartório. Ela responde legalmente pela empresa. E, mais do que isso, ainda que em menor valor, tem dinheiro dela investido no negócio. Sua poupança, que vinha sendo abastecida por trabalhos que ela realizou, foi uma das fontes para o aporte inicial.

Nas últimas semanas, ela esteve participando de Semanas de Empreendedorismo em duas unidades do SENAC – Santana e Francisco Matarazzo. Convites que foram realizados somente após representantes das instituições visitarem o Bellatucci e comprovarem a veracidade do empreendimento. Semana passada, ela esteve presente na  Secretaria do Estado das Pessoas com Deficiência de São Paulo para falar também sobre o tema durante um Seminário.

Quem nos visita, pode acompanhar de perto a dedicação que ela tem ao seu trabalho, o quanto ela ama estar cozinhando, fazendo café e atendendo as pessoas. Mais recentemente, descobriu que adora também participar desses eventos.

Eu e meu marido somos sim sócios dela, mas, como sempre digo, a protagonista da história é a Jéssica. Sem o seu sonho, seu empenho e o amor que temos por ela, o Bellatucci não seria nem uma ideia, muito menos um empreendimento de  impacto social.

Enfim, dúvida respondida né? 😉

https://youtu.be/bawobL5CsFkhttps://youtu.be/970H-JfSZHkhttps://youtu.be/DdASBAl2uwM

jessica-pereira

Por que o Bellatucci não é “apenas” mais uma cafeteria

Como nosso site tardou um pouco para ficar pronto e o nosso blog mais ainda, tem alguns assuntos que já são antigos, mas que valem a pena serem explanados aqui. Esse espaço foi feito justamente para isso, para conversamos com nossos amigos clientes, contar para eles o que gostaríamos de contar se eles estivessem aqui, no nosso café inclusivo, sentados em uma das nossas cadeiras azuis tomando um capuccino e comendo um pedaço de bolo.

São raros os clientes que saem daqui sem um bate papo com a gente. Alguns mais longos, outros mais breves, mas sempre tentamos conhecer um pouco da história de quem está nos visitando e vice-versa.

Vale o registro aqui também de parte da história do Bellatucci, o primeiro café inclusivo do Brasil fundado por uma empreendedora com Síndrome de Down. Parte porque nossa história é longa, envolve 25 anos de batalha por inclusão e autonomia. Luta a qual só quem é família conhece. Mas, passando um pouco esse filme para frente, chegamos no capítulo atual.

O sonho da Jéssica sempre foi ter um restaurante, mas o alto investimento e o ritmo frenético que o estabelecimento demanda não se encaixavam com as nossas reais expectativas . Sim, porque tudo foi pensado, planejado, estudado. Foram meses para o sonho se realizar, nada aconteceu da noite pro dia. Foi então que eu e meu marido (o sócio da Jéssica), após viajarmos pela América do Sul e termos conhecido inúmeros cafés charmosos, trouxemos essa ideia para a Jéssica.

Por que não abrir um café restô? Modelo muito comum em outros países e que ainda está ganhando espaço no Brasil. Não se trata de uma cafeteria, tipo Starbucks (bebidas à base de café, salgados e pessoas focadas em seu notebook trabalhando), é um espaço gastronômico onde as pessoas podem passar horas degustando quitutes e pratos que fogem do trivial, sem ver o tempo passar, porque se sentem acolhidas ali. É comum também esses espaços serem utilizados para eventos e encontros culturais.

E se o Bellatucci ainda não é assim, estamos caminhando na direção certa e a passos largos para isso. Até mesmo aqueles que por aqui passam buscando por um café rápido, acabam sentando, respirando, se acalmando e percebendo que é possível tomar um café com calma. Aqueles cinco minutinhos engolindo um café de pé pode se transformar em meia hora, tomando o mesmo café, sentado, batendo um papo, ouvindo uma boa música ou lendo uma revista. O café não muda, mas o ambiente e o estado de espírito sim e a bebida fica até mais gostosa.

Em três meses de funcionamento é exatamente esse tipo de feedback que estamos recebendo. Clientes gratos por encontrarem um oásis em meio a selva de pedra. Felizes em receber um atendimento caloroso, humanizado, olho no olho, sinceridade no “seja bem-vindo”. Clientes que entram para tomar um cafezinho e acabam almoçando, comendo sobremesa e tomando outro cafezinho rs. Clientes que se sentem acolhidos em nosso espaço, pois percebem o amor que ali permeia.

Todo dia temos uma surpresa boa. Seja uma palavra, uma visita, uma avaliação ou comentário nas redes sociais. O mais importante é que sentimos que são elogios sinceros. Não tem condescendência. Os elogios são para o nosso espaço, o nosso serviço, o nosso atendimento e o nosso cardápio. Não é porque a Jéssica, o Phillipe, a Priscila, a Bárbara ou a Jaque são “bonitinhos”. É porque eles estão fazendo o trabalho deles corretamente. É porque o Bellatucci está dando oportunidade para eles trabalharem e aprenderem com erros e acertos.

O café não saiu direito? Acontece, todo mundo erra, faz outro! O bolo queimou? Bate uma massa nova. O nhoque ficou duro? Tenta de novo! Aqui todo mundo é aprendiz. Não tem um chef nos bastidores fazendo tudo. Quem faz é a Jéssica – uma cozinheira amadora que sonha em ser uma chef, mas ainda não é – com a ajuda dos seus amigos e da sua mãe, que sempre cozinhou só para sua família. É tudo de verdade. E é esse coração aberto, transparência e essa casa de vidro que criamos, que ganha a empatia das pessoas. Percebe a diferença entre empatia e condescendência?

Aliás, esse último exemplo do nhoque, me faz lembrar de um caso real. Um dia, uma cliente veio aqui e o nhoque de mandioquinha não estava no ponto certo. Com a sinceridade que tanto prezamos e pedimos aos nossos clientes, ela nos contou que estava indo embora insatisfeita. A Jéssica, como profissional e não como uma coadjuvante da história, se desculpou pelo seu erro. Porque foi erro dela mesmo. Ela que faz, ela que errou. E ela assume. Ponto. Aliás, essa é uma das coisas que prezamos por aqui, não temos que poupá-los. Se queremos inclusão, comecemos de casa (ou do trabalho) a tratá-los igualmente.

Depois do ocorrido, a Jéssica passou o dia todo chateada e inconformada com a falha. Quando chegou a noite em sua casa, ela tomou a iniciativa de preparar uma nova massa. No dia seguinte, quando chegou o horário do almoço, ela estava lá, na porta do consultório onde nossa cliente trabalha, com um prato de nhoque em mãos, dessa vez bem feito, e um novo pedido de desculpas, mas dessa vez não vinha acompanhado de desapontamento e sim de orgulho, por ter se superado.